Olá, pessoal!
É claro que todo bumeranguista sabe que uma das coisas mais importantes de um bumerangue é o perfil aerodinâmico de suas asas, ou seja, seus aerofólios. Um bumerangue sem aerofólios simplesmente não volta! Os mais experientes podem até dizer que um bumerangue de material leve funcionará apenas com uma torção das asas, mas até mesmo isso é um tipo de aerofólio!
Um aerofólio é constituído basicamente de uma borda de ataque (ausente em alguns casos) e uma borda de fuga, podendo ter também undercuts, que são leves desbastes embaixo do ataque (mais comum) ou da fuga (mais vistos em modelos para Aussie e LD). A largura e a profundidade desses componentes vão afetar diversas características do voo do bumerangue. O aerofólio pode ainda ser reto, suavizado ou arredondado. Sabendo como funciona cada coisa dessas, você pode obter melhores resultados quando for fazer seu próprio bumerangue ou alterar um já pronto.
Vamos ver como cada uma dessas características contribui para o voo. Lembrando sempre que o que será dito aqui são apenas noções gerais e que se deve levar em conta que, quando tudo isso se junta com todos as outras características do bumerangue, é impossível prever os efeitos com exatidão.
Começaremos pela borda de ataque. Ela geralmente é pouco larga e pouco profunda. Quanto mais profunda, menor vai ser o arrasto gerado, então o bumerangue terá um voo mais rápido. Se ela for muito larga, o arrasto também vai cair, mas a sustentação será prejudicada, fazendo com que o bumerangue voe um pouco mais longe (se for exagerado, ele não completará o voo). Isso também vais fazer com que o voo seja um pouco mais baixo.
[1] Modificações na borda de ataque.
Já o
undercut no ataque vai aumentar a sustentação do bumerangue, fazendo com que ele tenha um voo mais curto. Também vai aumentar a velocidade com que o bumerangue se deita, deixando o voo mais alto. Geralmente são bem suaves não passando de 1 mm de profundidade. Apenas modelos de LD têm
undercuts muito pronunciados.
[2] Undercut no ataque.
Quanto à borda de fuga, seu efeito maior vai ser sobre a distância do voo: quanto mais larga ela for, mais sustentação será gerada, reduzido a distância alcançada. Sua largura é bem maior que a da borda de ataque e a profundidade pode ser igual ou também maior. Mas devemos tomar o cuidado de não fazer a fuga muito fina ("afiada"), ou o bumerangue irá ficar mais sensível a erros no arremesso, principalmente na parte final do voo. Note que, se seu bumerangue não tiver sustentação suficiente, um
undercut no ataque vai ter um efeito maior do que alargar a fuga. Mas também reduzirá bastante a resistência ao vento, então mexer na borda de fuga pode ser a melhor solução, mesmo dando mais trabalho.
[3] Modificações na borda de fuga.
O
undercut na fuga é pouco utilizado, mas seu efeito principal é reduzir a sustentação, sendo que também há uma pequena redução no arrasto. Deve ser feito com cuidado, pois se for exagerado o bumerangue não voltará mais.
[4] Undercut na fuga.
Uma modificação pouco conhecida, mas que é bastante útil é fazer a lateral da borda de funga inclinada. Isso pode aumentar consideravelmente a resistência do bumerangue ao vento.
[5] Lateral da fuga.
Outra coisa que vemos muito pouco por aí é a borda de fuga côncava. Ela faz o bumerangue ser mais resistente ao vento e é usado em
Fast Catches para ventos fortes e
Aussies. O problema aqui é fazer essa borda, devido a seu formato. Uma possível solução é usar um rolo de lixa em alguma ferramenta elétrica rotatória, como uma micro-retífica.
[6] Borda de fuga côncava.
Notem também que asas mais estreitas reduzem a superfície do aerofólio e, portanto, a sustentação, além de aumentar a resistência ao vento. Mas ao fazer isso devemos ficar atentos a duas coisas: 1 - Asas mais estreitas são mais frágeis e podem quebrar mais facilmente; e 2 - Asas mais estreitas tornam o bumerangue mais leve, então, se ele for leve de mais, a resistência ao vento vai acabar diminuindo. Assim, precisamos tomar cuidado para não passarmos do ponto quando estreitarmos as asas. E para descobrir que ponto é esse para cada modelo, só através de testes práticos.
[7] Reduzir a largura da asa melhora a resistência
ao vento
Outra coisa que devemos levar em conta é o quanto arredondamos os aerofólios. Quanto mais arredondado for o perfil, Mais sustentação ele irá gerar e menos arrasto bumerangue irá ter. Assim, além de ter o alcance e a resistência ao vento reduzidos, ele chegará com muita energia, dificultando mais a pegada. Aerofólios extremamente arredondados são bons para aviões que tentam aumentar a eficiência da asa ao máximo, melhorando a sustentação e reduzindo o arrasto, mas em bumerangues isso seria desastroso! As melhores opções são os perfis completamente retos (se for necessário mais arrasto) ou, no máximo, suavizados (reduzem o arrasto, mas não exageradamente).
[8] A: perfil arredondado
B: perfil suavizado
C: perfil reto
Quando se está criando um modelo novo ou até mesmo utilizando uma planta que não traz o esquema do aerofólio, um bom começo é usar um perfil conhecido como
semi-crude (em tradução livre, seria algo como "tosco" ou "mal acabado"). Ele possui as superfícies retas e tem uma boa relação entre sustentação e arrasto. Serve para a maior parte dos modelos, com exceções de LDs,
Aussies e MTAs, mas seu forte mesmo são os modelos apenas para diversão. A partir dele você pode fazer alterações para obter outros resultados de seu interesse (veja a
tabela de correção de erros para um guia prático). Perfis mais apropriados para modelos de competição serão abordados em outras postagens no futuro.
Há quem defenda que o
semi-crude deve ter uma borda de ataque com 1/2 da espessura do material em profundidade e com largura igual à espessura total do material. Exemplo: em uma chapa com 4 mm de espessura, o ataque teria 2 mm de profundidade e 4 mm de largura. Já a borda de fuga teria também 1/2 da espessura do material em profundidade, mas teria a largura da metade da asa. Mas você pode testar outras proporções: ataque com profundidade de 1/3 a 1/4 da espessura do material, fuga com profundidade de 2/3 ou 3/4 da espessura do material e largura com 1/3 a 1/4 da largura da asa também podem funcionar em muitos modelos para diversão.
E uma última dica de como usar aerofólios em modelos com três asas: se você deixar as bordas da região central (cotovelo) mais quadrada, o bumerangue chegará como menos velocidade. Se você quiser que ele não perca tanta velocidade, faça as bordas arredondadas ou mais largas. O ideal é fazer isso ao poucos e ir testando até que obtenha o resultado desejado.
[9] O bumerangue da direita chegará com maior velocidade.
Para saber como usar aerofólios no cotovelo de modelos de duas asas, veja a postagem sobre
formato do bumerangue. Para saber como o perfil na ponta das asas altera o voo, leia a postagem que explica
porque o bumerangue volta deitado.
Até a próxima.
Ítalo Carvalho
Créditos das imagens:
[1] a [7]: Ítalo Carvalho
[8]: Adaptado de L'Essentiel du Boomerang, por Didier Bonin & Olivier Duffez (Chiron Editeur)
[9]:
Performance Boomerangs, por John Cross, versão digital por David B Bjørklund.